Em um desses dias monocromáticos de mês chuvoso,
pairou no ar a pergunta:
O que fazer em um dia de chuva
com uma criança pequena e ativa dentro de um apartamento?
…
Mais uma pequena coleção de dias chuvosos
e a pergunta ganhou vulto, desfilando soberana:
O que fazer em vários dias de chuva
com uma criança pequena, ativa e desejosa de passeios, dentro do apartamento?
…
A resposta veio rápida como um raio (e o resultado foi mais para um trovão):
procurar um animalzinho de estimação, claro!
Olhando pelo lado prático a idéia seguiu para o tradicional “nada grande ou que dê muito trabalho”, e eis que nos deparamos com a sugestão de um hamster chinês. Do qual, por sinal, não ouvira falar nada a respeito até então. Tomando coragem e seguindo o impulso, fomos à loja de animais.

Depois de uma generosa troca de perguntas e respostas com o vendedor, conhecemos finalmente o João Pulo.
Olhamos para ele, ele nos olhou e fomos para casa assim, todos juntos.
A pergunta feita ao vendedor não deixava margem de dúvidas:
– Não entendo absolutamente nada a respeito de hamsters. Eles ficam do tamanho de um porquinho da índia?
Não se pode dizer o mesmo a respeito da resposta:
– Sim, bem, ficam do tamanho deles, não bem um porquinho da índia, tem uma proporção, é, mais ou menos.
Entendendo como um “quase sim”, levamos o hamster.
Primeiro dia em casa, só alegria. O bichinho, ainda estressado do ritmo alucinante em que vivia, demonstrava alguns hábitos diurnos. Tudo ótimo. Tiramos da gaiolinha, brincamos, fizemos carinho.
Mal podíamos esperar para que ele crescesse (na loja vendiam até coleira para passear com o hamster, que a essa altura, já havia assumido no imaginário o tamanho de um coelho anão)
Para não dizer que não foi feita nenhuma pesquisa, resolvi checar a respeito do bichinho na internet. Algo começou a parecer um tanto quanto estranho… como é que o tal hamster chinês fica entre 10cm e 13cm?
Busco a régua para conferir a medida e certificar-me que em realidade ele já tinha praticamente esse tamanho.
Será que… o João Pulo já é adulto?! Mas se já é adulto… então… ele é um rato! Um rato!
Diante da perspectiva de ter um ratinho em casa, o instinto primário veio a tona e subitamente o que seria uma gracinha, misto de coelho com esquilo, transformou-se em um animalzinho um pouco mais dinâmico e fugidio do que o desejado, especialmente no quesito de ser segurado por mãozinhas de 2 anos de idade… Diante de uma mãe em pânico, que subitamente descobre ser incapaz de colocar o ratinho de volta na gaiola (uma mordidinha no dedo colaborou), o João Pulo resolveu por bem esconder-se debaixo do sofá.
Um pequeno rebuliço tomou vulto na casa, mas por fim o bichinho foi encontrado são e salvo e voltou para a casinha.
No dia seguinte a mamãe já não queria tirá-lo de lá, e nem no outro. Talvez por um receio muito primário, mas possivelmente pelo fato do João Pulo ter decidido, obviamente, apavorar-se ao me ver, ficando deitado de costas, com a barriga a mostra e fazendo um barulhinho um tanto quanto ameaçador se comparado a seu tamanho diminuto.
Depois de muito pensar e muita delonga, decidiu-se devolvê-lo e buscar um animalzinho que efetivamente tivesse uma proporção adequada para brincar com uma criança pequena, e que acordasse antes de meia noite. Munidos do espírito de resolver as coisas, voltamos a loja de animais.
Fazia muito calor e o lugar estava lotado, com um barulho intenso. Quando nos acercamos da gaiolinha de vidro que tinha os outros hamsters, tivemos a certeza de que o João voltaria com a gente para casa… Estavam desmaiados, grudados no vidro e totalmente molhados de suor. Fazer o que?
E foi assim que o João Pulo conquistou nosso lar e nossos corações…
Conformada com o fato do hamster fixar moradia, decidi que teríamos que trabalhar nossas diferenças. Nos primeiros dias foi mais difícil, mas embuída da intenção de flexibilizar meu julgamento a respeito do hamster, tirei o João da casinha, coloquei na mão, cantei mantras. Ele adorou. E de lá pra cá, tem se mostrado cada vez mais mansinho e familiarizado com a dinâmica de casa.
Já o pequetito, que não tem nem nunca teve receio algum, transporta o hamster com muito cuidado para onde bem entende. E foi assim que a família ganhou um pequeno aliado para as tardes chuvosas de nosso apartamento…

Pergunto ao pequetito sobre os sentimentos dele a respeito do hamster:
– Você gosta do João Pulo?
– Sim.
– Ele é seu amiguinho?
– Não.
– O que ele é então?
– Só João Pulo.
E assim é.
